Indômito - Capítulo 2



Uma das primeiras lembranças que Maya Kendrick tinha de sua vida, foi o dia que voltando para casa do jardim da infância acompanhada por sua babá, descobriu da pior forma possível que a sua querida mãe a tinha abandonado.

Entrou naquele dia como sempre fazia, gritando e correndo por toda a casa, a sua procura. Checou os banheiros, a cozinha e o jardim.  Tinha urgência em contar-lhe as novidades. Naquele dia começou a aprender as primeiras letras e, estava maravilhada com a descoberta.

Maya viu seu pequeno e perfeito mundo desmoronar quando deu de cara com o seu pai, que esperava por ela no ateliê da mãe. Ele nunca estava lá naquela hora do dia, mas ela ficou feliz por encontrá-lo.

Foi a coisa mais difícil que Ewan teve que fazer. Foi insuportável ver o desespero de sua amada filhinha. Ele se culpava de ser o portador de tão más notícias. Mesmo ele ainda estava atordoado com a descoberta do simples bilhete, frio e covarde, deixado por Kate na porta da geladeira.

Ela que até então era uma menina extrovertida e feliz, transformou-se praticamente do dia para a noite em sinônimo de problema. A babá que tinha cuidado dela desde que era um bebê, pediu demissão, já que o seu suposto anjinho, tinha se transformado num monstrinho com lindos cachinhos dourados. Depois disso, nenhuma babá durou mais de quinze dias. E até outros funcionários da casa também pediram demissão.

A rotina da casa se transformou num caos. E Ewan, já não dava conta de mais nada. A bagunça começou a interferir no andamento de seu escritório, já que como sócio sênior, muitas das principais decisões dependiam dele.

Ele culpava sua ex-esposa como o principal detonador da confusão que reinava agora, naquela casa. Ela simplesmente tinha esperado que a menina fosse para a escola e, na maior frieza, simplesmente saiu. Tinha planejado tão bem a coisa toda, que ele não havia percebido que já tinha feito as suas malas e despachado a maioria de suas coisas dias antes. Deixou a maioria de seus quadros à venda numa galeria e, saiu porta afora, sem olhar para trás.

Segundo ele, Kate foi uma egoísta sem coração. Que o tivesse deixado, ele entenderia, era um homem ocupado, quase sem tempo para a esposa romântica e sonhadora. Mas deixar a filhinha deles em tão tenra idade? Por mais voltas que desse, não entrava em sua cabeça.

Maya não conseguia entender o que estava acontecendo a sua volta. Tudo estava mudando rapidamente e de forma tão drástica. Os primeiros sintomas foram os pesadelos que tinha todas as noites, a falta de apetite, a agressividade gratuita com que tratava a todos a sua volta e a queda do rendimento escolar.

Ewan foi chamado na escola quando ela orquestrou um plano diabólico de vingança contra um grupo de meninas que a tinham excluído de seu grupo, justamente por seu comportamento agressivo e discussões violentas com os demais membros. Quase foi expulsa dessa vez, fato exigido pelos outros pais, já que várias delas tiveram a pele e o cabelo danificado, pela "brincadeira" de Maya. Ewan, como excelente advogado que era, conseguiu contornar a situação com a promessa de que sua filha faria terapia intensiva.

E foi na terapia que ele conheceu Emma Ward que era psicóloga de sua filha. Percebeu que ela tratava a sua menina muito bem. Maya sentia-se à vontade perto dela. E, foi com a paciência que teve que pouco a pouco, a menina se aproximou do que era antes. Talvez, ela fosse a figura feminina de que a filha tanto necessitava.

E, ele ainda era tão jovem! E ela era tão bonita, tão doce. Emma nunca se importava ou reclamava que quando saíam muitas vezes precisavam levar Maya junto.

Rapidamente se casaram. Não demorou em terem filhos e, em seguida três novos bebês corriam pela casa. Emma era amorosa e dedicada e, Maya sentiu-se incluída na nova família e, surpreendentemente, dava-se bem com as duas irmãs e o irmão que ganhou.

Os problemas de autoestima e rejeição continuaram. A raiva estava sob controle, mas ainda estava lá pairando como uma nuvem negra sobre a sua cabeça, pronta para explodir.

Descobriu que a atenção dos meninos era mais que bem-vinda e o sexo uma ótima válvula de escape. Portanto,  na adolescência andava pelos corredores da escola como se fosse uma rainha com o seu séquito de bajuladores atrás dela, prontos para atenderem a qualquer pedido.

Era uma aluna excelente e, recebeu vários prêmios em projetos de matemática, química, física e artes. Fez parte da equipe de esgrima e de ginástica artística. Foi a oradora de sua turma do ensino médio.
Desde cedo, mostrou interesse em programação e desenvolvimento de softwares. Estava na oitava série quando criou a intranet e desenvolveu um aplicativo eficiente para o seu escritório de advocacia. Diante do sucesso, Ewan então decidiu contratar um tutor para ela, que era professor na East London University. O seu raciocínio rápido e lógico o surpreendeu. Maya que ainda era uma menina do ensino fundamental era melhor que seus alunos da universidade.

Entrou em Oxford com uma nota excelente e, logo conheceu Zane Roberts, um nerd típico. Era desengonçado, alto, com cabelos ruivos que caiam sobre seu rosto, e vibrantes olhos verdes. Tinha o rosto salpicado com sardas. Sempre se atrapalhava com alguma coisa, era um desastre total com as coisas práticas da vida, mas no geral era muito calmo. E apesar da diferença abismal de personalidade, deram-se bem quase imediatamente. Ele tinha a paciência necessária para lidar com a complexidade dela.

Desenvolveram vários projetos juntos com relativo sucesso entre a comunidade estudantil. Já eram bem populares devido aos jogos criados e à mídia social que desenharam. Tinham tudo catalogado num site  que mantinham para a pequena empresa que criaram, a Teqron. Ewan os ajudava com a parte legal, registrando a propriedade intelectual de suas criações.

Um belo dia de primavera, Maya teve uma ideia brilhante e, dividiu-a com Zane. Começaram então a desenvolver uma nova plataforma. Depois de muitas idas e vindas tinham criado um sistema operativo revolucionário, que era desejado por todos.

Não sabiam o que lhes atingiu. Praticamente da noite para o dia, aos vinte e um anos eram milionários e, estavam em todos os sites, revistas e jornais do mundo.

Começaram numa pequena casa, na zona oeste de Londres. Mas o volume de negócios, e a quantidade de funcionários, obrigou-os a mudar-se para um edifício comercial, onde alugaram os cinco últimos andares. Agora, fazia um ano que tinham se mudado novo edifício corporativo, na revitalizada zona leste de Londres, próximo ao Parque Olímpico. 

Mas Maya, apesar de ser um prodígio, continuava com os problemas que carregou durante toda a vida. A diferença é que agora, aos vinte e sete anos, era cínica o suficiente para disfarça-los. E no geral, era uma cadela com todos que cruzavam o seu caminho. Era temida por todos os seus subordinados, porque ela não pensava duas vezes em esculachar quem quer que fosse, no lugar que estivesse. Não tinha compaixão por nada e por ninguém. Era detestada por todos, que secretamente a chamavam de Bruxa Pigmeia, devido à sua baixa estatura. Todos preferiam tratar com Zane que era muito mais afável.

O único que não podia se dar ao luxo de fugir do mau humor e de sua ira, era Theo Parker seu secretário. Ao longo dos últimos seis anos tinha aprendido a lidar com ela e a contornar as suas famosas crises.

Mas, naquela manhã em particular estava atrasado, já que teve que passar a noite no hospital com a sua mãe que teve uma intoxicação alimentar. Era sua função, estar com uma xícara de chá pronta sobre a mesa de Maya, na temperatura correta, sem muito açúcar, antes que ela chegasse ao escritório.
Desceu do taxi e entrou no edifício correndo como um louco. Olhou o relógio, enquanto esperava pelo elevador, batendo o pé impaciente. Por que tinha que demorar tanto? Sentia que uma fina camada de suor frio já lhe cobria o rosto. Também não tivera tempo de barbear-se. Correu do hospital para casa e, somente teve tempo de jogar uma água no rosto e trocar rapidamente as roupas do dia anterior. Deus, ele estava um desastre.

O elevador lotou e, conseguiu parar em todos os andares possíveis. Subia a passo de tartaruga. Que agonia! Theo checava inutilmente o seu relógio segundo a segundo.

Não acreditou quando ouviu o sinal sonoro que indicava ter chegado ao quadragésimo primeiro andar. Correu em direção à sua mesa e, literalmente jogou suas coisas lá. Depois foi em direção à cafeteria para preparar o famoso chá de sua chefe.

Corria com a xícara, o pires, a colher e companhia pelos longos corredores, quando trombou de frente com Maya que chegava ao escritório. Ele fechou os olhos, respirou fundo e esperou pelo pior. Passaram-se alguns segundos angustiantes e nada.

Quando teve coragem de encara-la, ela o olhava como se fosse um vulcão prestes a entrar em erupção. Olhou devagar para a xícara quebrada aos seus pés e de volta para ele com uma falsa calma. Depois olhou para o seu vestido de tweed azul bebê. O chá era rapidamente absorvido pelo tecido sofisticado e, deixou uma mancha escura e enorme na frente da peça.

 Não teve "bom dia" nem nada.

— Você tem a mínima noção de quanto custa esse vestido, Senhor Parker? Ela perguntou com uma raiva sussurrante, enquanto passava a mão por seus curtos cabelos.

Ele olhava para ela paralisado de medo com os olhos arregalados.  Não tinha nenhuma reação.

— Responda Senhor Parker. Acho que a pergunta não foi tão difícil assim. Ela ironizou com um sorriso zombeteiro e uma sobrancelha perfeita levantada.

— Não senhora. Ele disse num fio de voz.

— Acho que não te ouvi direito.

— Não sei, não senhora. Ele disse mais alto.

— É a porra de um Valentino e, custou mais de duas mil libras, querido. Ela gritou a plenos pulmões.
— Eu vou providenciar a lavagem a seco, senhora.

— Eu quero você em cinco minutos na minha sala, com uma nova xícara de chá e a agenda do dia.
Ele engoliu em seco, assentiu e correu para cumprir as ordens dela.

Que ninguém se engasse com o seu aspecto angelical e pequena estatura. As feições delicadas demarcadas por grandes olhos cinzas , claros e brilhantes, as bochechas coradas e a pequena boca de onde saiam os mais terríveis impropérios.

Ainda estava para surgir a boa alma que domaria a megera Maya Kendrick.




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Autor Nina Draper

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